Afuá a cidade das bicicletas na Amazônia – Urbanização

Afuá é uma pequena cidade de 40 mil habitantes, localizada no Arquipélago de Marajó, estado do Pará, no norte do Brasil, pode ser considerada por muitos como parada no tempo, mas, após uma visita, fica claro que ela é um vislumbre de um futuro possível. Construída em cima de palafitas de madeira devido às cheias do rio Amazonas, o código de posturas do município proibiu, em 2002, o uso de qualquer veículo motor, incluindo elétricos, em suas ruas. Lá, todos, sem exceção, têm a bicicleta como meio de transporte.

FOTO DE GABI DI BELLA in National Geographic

Se em Afuá não há carros, ou motos, também não há leis de trânsito. Nenhuma mísera placa de pare. Congestionamentos? Multas? Nem pensar. Dar voltas e voltas para estacionar, medo de ser atropelado? Jamais. Outra ausência: mortes em acidentes de trânsito. Quando estes acontecem, são leves, geram poucos ferimentos e costumam ser causados por forasteiros tal como esta jornalista que pedalou para fazer esta reportagem. A atenção e o respeito pelo espaço do outro são o código não escrito da mobilidade.

Estranho é perceber que o movimento nas ruas é tão intenso quanto silencioso. Um silêncio quebrado somente pelo barulho do motor dos barcos que passam pelo rio e pela eclética música das caixas de som do animado povo paraense – um movimento que obedece aos horários de calor e às marés. Os afuaenses se movem conforme chegam e partem as barcas para Macapá ou Belém – as capitais mais próximas –, pulsando entre a lógica de conviver de maneira harmônica com a natureza, obedecendo sua geografia e clima, e a eterna pressão para adotar um modo de vida urbano mais ‘moderno’, movido a motor.

FOTO DE GABI DI BELLA in National Geographic

Esta relação de harmonia com a natureza é muito clara para a turismóloga da secretaria de Esporte e Lazer da cidade, Andra Lúcia Chaves Ataíde, 39 anos. Nascida e criada em Afuá, Ataíde enfatiza o quanto a bicicleta é o eixo central do cotidiano na cidade. “A cidade inteira anda de bicicleta, a nossa vida é a bicicleta, nosso meio de transporte é a bicicleta e vai ser pelo resto das nossas vidas”, diz ela. “Nossa cidade é específica para este modelo de transporte sustentável.”

Por ser uma cidade 100% sem carros, Afuá se tornou conhecida em diversos lugares do mundo e ganhou alguns apelidos – como Veneza Marajoara e Copenhagen da Amazônia, locais cuja mobilidade também prioriza vias aquáticas ou ciclovias – e virou referência para arquitetos, historiadores, fotógrafos e ciclistas. A fama rendeu a Ataíde alguns convites para falar em palestras e conferências. “Uma vez, antes de uma palestra em Belém, me perguntaram quantos quilômetros de ciclovia tinha a minha cidade. Eu falei que cerca de 24 mil metros. Não acreditaram, até que comecei a mostrar as fotos”, lembra.

FOTO DE GABI DI BELLA in National Geographic

Ataíde conta que a família se mudou para Macapá quando ela tinha 12 anos. Depois de se formar na faculdade, no entanto, decidiu voltar para Afuá. “Eu me sinto presa quando preciso me deslocar de carro; aqui nós exercitamos o direito de ir e vir plenamente, não esperamos uber nem táxi, a gente só pega a bicicleta e vai a qualquer lugar”, conta ela. “Até bêbado anda de bicicleta.” Hoje ela cria o seu filho, Daniel, quatro anos, pedalando por Afuá.

 

Fonte: National Geographic