Partículas em suspensão na atmosfera estão nos ajudando e contendo a temperatura do planeta, só não sabemos até quando.
A quantidade de poeira do deserto em suspensão na atmosfera da Terra aumentou em cerca de 55% desde a metade do século 19. Esse fenômeno vem mascarando em até 8% o aquecimento global causado por gases de efeito estufa, alerta um estudo da Universidade da Califórnia.
O mecanismo do esfriamento é bem conhecido. Partículas sólidas em suspensão na atmosfera têm efeitos variados, e ao menos dois são esfriadores do planeta: rebatimento de luz solar de volta para o espaço e dissipação de nuvens altas. Mas os modelos climáticos atuais não levam em conta que esse fator vem aumentando há mais de 150 anos.
O efeito esfriador não deve ser comemorado, porque não há como prever, no momento, se ele vai persistir. Se as tempestades de areia nos desertos (que jogam a poeira para cima) perderem força ou simplesmente se estabilizarem, o efeito esfriador enfraquece — e o aquecimento global se acentua. “O aumento da poeira (em suspensão) não causou muito esfriamento. Os modelos climáticos continuam bem certeiros. Mas nossos achados indicam que os gases de efeito estufa podem causar ainda mais aquecimento global do que os modelos atuais preveem”, diz o físico Jasper Kok, líder do estudo, publicado na revista Nature.
O estudo importa não apenas para melhorar os modelos climáticos e as decisões tomadas a partir deles. A ação humana aqueceu o planeta em pelo menos 1,2 graus Celsius desde 1850. Sem as partículas em suspensão, a temperatura provavelmente teria aumentado em 1,26 graus Celsius. Como estamos tratando de consequências catastróficas, a pequena diferença se torna relevante. O Acordo de Paris definiu como objetivo global conter o aumento médio de temperatura global em até 1,5 graus Celsius acima da média pré-industrial.
Os pesquisadores avaliaram a quantidade de material na atmosfera atuamente, por meio de análises de satélite e a partir do solo (e concluíram que há 26 milhões de toneladas dessas partículas em suspensão atualmente). Em seguida, analisaram o registro geológico, por meio de camadas antigas de gelo, sedimento marinho e turfa, colhidos ao redor do mundo. Essas amostras revelaram aumento regular da poeira do deserto desde meados do século 19.
A quantidade de poeira em suspensão pode ter aumentado por fatores naturais, como aumento de força dos ventos ou frequência das tempestades no meio dos desertos, e por fatores humanos, como ressecamento de solos e desertificação ao redor do mundo (consequências de agricultura, pecuária e ocupação de solo mal planejadas). Com tantas variáveis, não há como saber no momento se a quantidade de poeira desértica na atmosfera vai frear o aquecimento global também nas próximas décadas.
Fonte: Globo https://umsoplaneta.globo.com/clima/noticia/2023/01/21/tempestades-de-areia-vem-nos-ajudando-contra-o-aquecimento-global-mas-ate-quando.ghtml